Título: Anna Kariênina
Título Original: Анна Каренина
Autor(a): Liev Tolstói
Gênero: Romance Filosófico, Tragédia
Ano de Publicação: 2005
Ano de Publicação Original: 1875
Editora: Cosac & Naify
Número de Páginas: 816
ISBN: 978–85–7503–841–3
Idioma Original: Russo
Nota: 5.00/5.00

TOLSTÓI, L. Anna Kariênina. [s.l.] Cosac Naify, 2005.

Contexto Histórico: Publicado em 1878, este romance reflete a sociedade russa do século XIX, marcada por rígidas normas sociais.

“Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. Assim, com um soco no estômago, Tolstói inicia sua história de amor e tragédia.

Tolstói é conhecido por seu estilo narrativo detalhado e sua habilidade em explorar profundamente a psique de seus personagens. Ele utiliza uma voz narrativa onisciente, que lhe permite apresentar os pensamentos e sentimentos mais íntimos de seus personagens, além de poder se aprofundar em questões mais complexas e filosóficas que cada personagem enfrenta, ele não se limita a relatar os acontecimentos, mas também julga as ações dos personagens, revelando aspectos que eles próprios desconhecem.

Frequentemente, Tolstói intercala discussões sobre política, filosofia, sociedade e até assuntos triviais em sua narrativa, refletindo as preocupações e debates da Rússia do século XIX. Esses elementos adicionam uma camada de profundidade à história, transformando-a não apenas em um drama pessoal, mas também em um comentário sobre questões sociais e morais mais amplas. Em um determinado momento, Levin — personagem que exploraremos mais adiante — desenvolve uma discussão completa sobre mão-de-obra, meios de produção e lucro, que por si só poderia constituir um livro à parte.

Tolstói reflete sobre a complexidade do amor e do desejo, dividido entre compaixão e rigor moral, entre luxúria e abnegação. Ele usa personagens para explorar diferentes facetas do amor e do relacionamento matrimonial, ora de forma delicada e até ingênua, ora de forma perversa e maliciosa.

Os Oblonskys, a quem se refere a frase inicial do livro e deste artigo, representam a infelicidade familiar. Eles simbolizam a aristocracia russa da década de 1870, uma classe que luta para manter suas tradições em meio a mudanças sociais significativas após a emancipação dos servos. Onde famílias falidas vivem da aparência, de seus títulos. Aliás existem tantos príncipes e princesas que os títulos acabam meio que se tornando piada, o comum nessa cada vez mais inchada alta sociedade, onde um deslize pode acabar com o frágil status levando a pessoa, e talvez sua família, ao ostracismo.

O romance segue várias linhas narrativas, destacando-se as vidas de personagens da alta sociedade russa e algumas histórias paralelas que não estão ali só para fazer volume, mas de fato aprofundam ainda mais sobre os personagens. Anna, a protagonista, é uma figura de tal beleza e elegância que ofusca todos ao redor e que, apesar de aparentemente contente em seu casamento, encontra o verdadeiro amor e enfrenta as consequências sociais de suas escolhas.

A representação do espaço e tempo é particularmente notável em “Anna Kariênina”. Tolstói oferece uma descrição rica do campo, em contraste com a representação quase invisível das cidades, refletindo uma preferência pelo natural em detrimento do artificial. Além disso, ele captura a passagem do tempo de maneira realista, permitindo que os personagens sejam fiéis às suas emoções momentâneas, mesmo quando contradizem seu retrato geral. O campo, por vezes, é um alívio, um momento de contemplação, mas que também precisa de trabalho árduo e constante, em oposição com a cidade onde a maioria só parece trabalhar.

Tolstói retrata uma sociedade onde aparências e etiqueta têm grande peso. As interações sociais são complexas, repletas de subtextos, onde mulheres devem, somente, parecer inteligentes e homens devem sempre ser viris e entender de tudo, ou pelo menos fingir de forma convincente, o que muitas vezes revela a hipocrisia social e as limitações impostas, pelo nível social ou riqueza.

Incrível como o livro se mantêm relevante. Não precisamos nos transportar para a Rússia retratada no livro, pois o livro nos traz essa Rússia de forma tão natural que facilmente poderíamos vê-la em nossa vizinhança. As questões morais e filosóficas se comunicam facilmente com os dias atuais.

Uma coisa bem interessante é o contraste claro entre a vida dos aristocratas e a dos camponeses, assim como entre os diferentes personagens e suas jornadas. Enquanto Anna enfrenta a ruína por suas escolhas amorosas, outras histórias de amor no livro têm destinos diversos. E aqui amor não somente entre casais, amor pelos irmãos, pelos pais e filhos, e até pela recompensa do trabalho duro.


Tolstói não apenas conta uma história, mas também oferece uma crítica penetrante da sociedade e do papel do indivíduo nela. Seus personagens multifacetados e sua análise incisiva da sociedade e da condição humana tornam este livro um estudo atemporal sobre amor, perda e redenção. A complexidade narrativa, riqueza de personagens e relevância desafia os leitores a refletir sobre suas próprias vidas, crenças e a sociedade em que vivem, provando ser uma fonte inesgotável de análise literária e filosófica.

O fim do livro é marcante e trágico, ressaltando a luta de Anna contra as convenções sociais e suas próprias emoções. Sua história é um poderoso lembrete das consequências devastadoras que a rigidez social pode impor aos indivíduos, especialmente às mulheres, que sofriam as pressões sociais e essas limitações de forma mais cruel, tornando o livro mais do que uma história de amor trágica; é um espelho da alma humana e um exame das estruturas sociais que moldam nossas vidas, que limitam a liberdade pessoal e a busca pela felicidade.

“Anna Kariênina” é uma exploração profunda das complexidades do amor, da moralidade e da sociedade, centrada na trágica história de uma mulher que desafia as convenções sociais em busca da paixão, levando a consequências devastadoras.


Konstantin Levin

Preciso me aprofundar um pouco mais na trajetória de Konstantin Dmitrievich Levin, um dos personagens centrais do livro. Ele é um nobre russo que prefere a vida no campo à vida urbana e social de São Petersburgo ou Moscou. Levin é frequentemente considerado o contraponto moral e filosófico à trajetória tumultuada de Anna. Porém Levin encontra uma espécie de redenção e paz em sua vida rural e em seu casamento. Sua jornada reflete a busca de Tolstói por um significado mais profundo na vida, além das preocupações materiais e sociais.

Levin é introspectivo, honesto e busca um propósito mais profundo na vida. Ele luta com suas questões de fé, existência e moralidade, refletindo as próprias inquietações de Tolstói. Sua abordagem da vida é marcada por um desejo de autenticidade e simplicidade, contrastando com a complexidade e artificialidade da alta sociedade russa.

Levin é apaixonado por Kitty, cuja história de amor serve como um contraponto romântico e otimista à relação infeliz de Anna e Vronsky, que será discutida logo a seguir. O relacionamento de Levin e Kitty evolui ao longo do romance, simbolizando o crescimento, a maturidade e a realização do amor verdadeiro.

Com esse personagem Tolstói explora ideias sobre agricultura, filosofia, política e religião. Suas reflexões sobre o trabalho agrícola e a vida dos camponeses representam uma crítica às normas sociais da época e uma busca por um modo de vida mais genuíno e conectado à terra.

Ao longo do romance, Levin experimenta um crescimento significativo. Ele começa como um homem bastante indeciso e inseguro, mas gradualmente encontra clareza em sua vida pessoal e profissional. Sua jornada espiritual culmina em uma epifania sobre a natureza da fé e o propósito da vida. Ele representa a ideia de que a verdadeira felicidade e realização vêm de dentro e de um modo de vida em harmonia com os próprios valores.

Konstantin Levin é um personagem complexo e profundamente humano. Sua história não apenas oferece um contraste necessário às outras tramas do romance, mas também serve como uma reflexão sobre os temas universais de amor, propósito, fé e a busca pelo significado na vida humana. Levin é um dos personagens mais memoráveis do livro, encapsulando muitos dos ideais e questionamentos que são centrais para a obra.


Anna e Vronsky

O relacionamento entre Anna Karenina e o Conde Alexei Vronsky é um dos eixos centrais do romance de Liev Tolstói. É uma história de amor apaixonada, mas tragicamente condenada, que se desenrola contra o pano de fundo da rígida sociedade aristocrática russa do século XIX.

Tudo começa com uma atração mútua intensa numa estação de trem, simbolizando a partida de ambos de suas vidas convencionais. Anna, já casada com Alexei Karenin, e Vronsky, um oficial de cavalaria charmoso e socialmente destacado, são imediatamente atraídos um pelo outro, um sentimento que rapidamente se transforma em uma paixão avassaladora.

A relação de Anna e Vronsky é complexa e cheia de desafios. Enquanto eles encontram momentos de felicidade genuína, também enfrentam ostracismo social, culpa e conflitos internos. Para Anna, o relacionamento significa a perda de sua posição social, a separação de seu filho e o escrutínio constante da sociedade. Vronsky, apesar de menos afetado pelas convenções sociais por ser homem, também experimenta um conflito entre seu amor por Anna e sua carreira militar e suas ambições.

Tolstói apresenta a relação de Anna e Vronsky com uma mistura de compaixão e crítica. Através do narrador onisciente, somos levados aos pensamentos mais íntimos dos personagens, testemunhando como eles frequentemente mal interpretam um ao outro, revelando a complexidade e as falhas em sua comunicação e compreensão mútua.

A pressão da sociedade, o ciúme e a crescente paranoia levam Anna a um estado de isolamento emocional e psicológico, culminando em seu trágico fim.

O relacionamento de Anna e Vronsky em “Anna Kariênina” é uma representação poderosa e complexa do amor romântico, das restrições sociais e da tragédia pessoal. Tolstói usa esse relacionamento para não apenas contar uma história de amor apaixonada, mas também para tecer uma crítica profunda às normas sociais e morais de sua época, muitas das quais continuam relevantes até hoje.


A narrativa multifacetada e os personagens complexos tornam “Anna Kariênina” uma leitura essencial, não apenas como um retrato de uma época, mas como um estudo atemporal sobre a condição humana, e uma leitura altamente recomendada!

Espero que tenham gostado e boa leitura!

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